terça-feira, 16 de dezembro de 2008

O Eterno, o desejo e o Sangue



Por estes dias terminei de ler dois livros maravilhosos e muito opostos, apesar de similares.....tratam-se de “A eternidade e o desejo", da portuguesa, Inês Pedrosa e de “Sem sangue” do italiano Alessandro Baricco. O primeiro trata da história de uma portuguesa que volta à Bahia de todos os Santos , onde, no passado viveu uma história de amor, que acabou em tragédia, deixando-a cega; ela volta à Salvador, às Igrejas católicas, ela volta ao seu passado, e o livro é o seu relato da experiência de uma mulher que agora vive pelos seus outros sentidos;ela volta entremeando-se pelos Sermões de Padre Antônio Vieira. O livro é de um luxo só. Inês escreve fluindo, seu português é intrincado porem solúvel. Nos embevecemos nesta história que purga a dor e o sofrimento do passado de Clara ( esta personagem cega) ,ao mesmo tempo que nos apresenta uma história de amor, agora no presente desta mesma personagem. Inês nos apresenta o DESEJO como algo diretamente ligado à vivência da busca daquilo que torna-se eterno em nossa mente assim como em nosso corpo; vivências que nos marcam para sempre, deixando cicatrizes, rugas em nossas histórias.

No outro livro, é o reencontro da menina que teve sua família assassinada com seu “carrasco”. Anos depois. O livro é curto, tem 80 páginas. Suguei-o numa tacada só, tem um rítmo inebriante, como o outro, porém este é frenético, cheio de dores ,de lembranças da guerra e sem poesia nenhuma. O de Ines, é tão viciante quanto ,porém situado num cenário exótico e sensual. Um nos fala do amor e suas sinestesias num contexto “caliente” dos trópicos e o outro da purgação da dor pelo enamoramento através do carrasco.

Um trecho do de Inês: “Os teus filmes congelam a vida, tanto como as minhas palavras. Eu não posso ver os teus filmes, e tu amas-me em silêncio. Assim duraremos..... No Brasil, território de afetos exacerbados, o que primeiro se aprende é o desprendimento , ou o dom de amar esquecidamente.....quantas pessoas pelas quais me apaixonei consegui amar?”

Agora, um trecho do livro de Baricco: “por mais compreensível que seja a vida, provavelmente nós a cruzamos com o único desejo de retornar ao inferno que nos gerou, e de viver ali, ao lado de quem, uma vez, nos salvou, daquele inferno. Tentou pensar de onde vinha aquela absurda fidelidade ao horror, mas descobriu não ter resposta. Compreendia somente que nada pede mais forte do que o instinto de voltar para lá onde nos despedaçaram, e de repetir aquele instante por anos. Pensando apenas que quem nos salvou uma vez pode depois nos salvar para sempre. Num longo inferno idêntico áquele de onde viemos. Mas inesperadamente clemente. E sem sangue.”

Foi ai que encontrei o ponto de convergência de ambos os livros: ambos falam da dor extrema da perda de seres amados e a volta que sevemos fazer à estes em dado estado da vida. Ou melhor, nunca voltamos à eles porque nunca os abandonamos ou os superamos, eles andam conosco vida adentro, de mãos dadas, e vesti-los, encará-los de frente as vezes é a única maneira de vivermos. Temos de dar às mãos ao feio, ao horror e à dor que nos forjou. Do contrário nunca poderemos seguir adiante. É uma purgação que se faz no dia a dia. A catarse através pelo lado escuro, cego e macabro da vida

De mãos dadas com o desejo e com o horror, cega e eternamente, sem sangue, mas adiante, sempre.

domingo, 7 de dezembro de 2008

Exposições




Neste final de semana mergulhei nalgumas exposições; umas muito boas e outras nem tanto.

A 28ª Bienal de SP nem vale a pena comentar...mas vamos lá: fez me sentir culpada de ser uma profissional da área das artes e perceber como deixou-se acontecer uma mostra tão frustante como esta. Impressionante. No andar térreo alguns vídeos datados de Godard e outros; que para tanto não precisavam ser exibidos sob o título de uma Bienal Internacional, mas caberiam muito bem numa mostra de filmes temáticos. Indo ao segundo andar, nos deparamos com o já 'famoso' vazio; onde tentou-se recheá-lo de todo um conteúdo falsamente conceitual, passando pela discussão da arquitetura modernista de Niemeyer, patati patatá....aí, ai, muito blá blá blá para nenhum conteúdo! Trabalhei neste espaço durante duas Bienais, em 1994, a Internacional e a outra, intitulada Bienal Brasil Século XX e garanto que não é necesásria uma Bienal, uma instituição abdicar de instalar obras no andar para estabelecerem-se questionamentos estéticos e / ou filosóficos; e vejam bem que àquela época quem era o presidente da Fundação é nosso hoje tão famoso Edemar Cid....Havia todo um peso da curadoria de Aguilar, assim como o principal: OBRAS. Foi lá que nasceu o famoso "espaço climatizado", muito presente em posteriores Bienais. Mas desta vez, a Curadoria relamente deixou a mão escapar. Num terceiro andar todas as obras se confundem numa espécie de ‘mobiliário’ em compensado de madeira que parece uniformizar tudo, mimetizando as obras e tornando-as neutras umas às outras. Salvam-se alguns vídeos(antiguésimos), de Marina Abramovic e as lindas gravuras em metal de Leya Mira Brander e um vídeo de uma artista finlandesa. É isto a Bienal. Ou melhor, foi isto, ainda bem que acabou. Mas que vergonha Einnn Dona Fundação Bienal! Podiam ter pulado esta edição e feito uma coisa direito. Porque eu como profissional da área faço bem feito ou não faço. Fico pensando nos estrangeiros que fretaram vôos e vôos para virem até aqui checar esta BIENAL...do vazio. Ficaram de queixo caído e a única coisa que lhes restou foi literalmente escorregar pelo lúdico tobogã do artista belga Carsten Höller , que leva diretamente à frustante saída da mostra! Será que uma mostra que sempre se enquadrou no no topo da agenda mundial de acontecimentos das artes plásticas merece acabar numa escorregade-la ??

Depois decidi-me por ir ao SESC Pinheiros, onde se encontra uma maravilhosa mostra do teatrólogo e multímidia Robert Wilson, mas comumente conhecido como BOB WILSON. Fantástica, recomendo. Feliz perceber o perfeito casamento da Arte com a Tecnologia ( o que também pude aferir na também excelente mostra em cartaz no Itaucultural "CINEMA SIM"). Vejam ambas!!

Na mostra de Wilson, em cartaz, até o inicio de Fevereiro, intitulada “VOOM PORTRAITS” são expostos nos 3 andares do prédio, vídeo-retratos de alta definição, um feliz encontro entre a fotografia, o filme, a literatura e a música. Portraits em televisores de altíssima definilção, onde alguns atores, tais como Brad Pitt, Isabella Rosselini e Wynona Ryder, e outras personalidades do mundo POP, tais como a artista burlesca Dita Von Tesse, posam sob precisa direção de Wilson; cada um na pele de uma ‘personagem’ e desenvolvem no deocrorrer do tempo da filmagem mínimos e sutis movimentos, gestos cuidadosamente coreografados. Fiquei de boquiaberta. Estabelece-se um delicado bate papo com os retratos de Andy Warhol, as performances do também performático Matthew Barney (marido da ótima Björk), e uma mescla de outros tantos cineastas interessantes, Tim Burton, etc. A luz é sempre uma coadjuvante dos ‘retratos’. Algumas poucas manipulações são aplicadas sobre os vídeos que são sempre lupados e com 'trilhas musicais' compostas por Peter Cerone, Michael Galasso e Glen Gould só contribuem para a melhor qualidades destas peças. Wilson, como ninguém soube combinar o movimento, a iluminação, a imagem em alta deinilção e um tema mais que clássico e recorrente da história da arte, o Retrato e, trazê-lo para uma discussão contemporânea, . E isto tudo sem perder conteúdo. Vejam!!

De lá fui ao Instituto Tomie Ohtake conferir a mostra em homenagem a José Saramago. O material traz obras inéditas, manuscritos, notas pessoais, primeiras edições, traduções, fotografias, vídeos e gravações originais que traçam a vida literária do escritor.

A mostra é intitulada “A consistência dos Sonhos”. Mas nossa, como é difícil transpor toda uma vida dedicada a literatura, à escrita , a solidão das páginas em branco e transpo-lá ao espaço expositivos de um ‘museu’. A literatura não se presta facilmente à ser ‘vista’ como um objeto museulógico. A coisa toda ficou muito didática e tediosa, sai de lá com dor na coluna de tanto que me debruçava sobre as vitrines que exibiam fotos e seus manuscristo. Saramago é um escritor maravilhoso mas, a exposição pareceu-lhe meter correntes nos pés. Excetuando-se as duas últimas salas grandes em que duas obras de um mesmo artista, articulam no espaço, fazendo projeções com palavras em cima de programas de softwares, se salvam as entrevistas em vídeos, onde podemos ver o próprio ganhador do Prêmio Nobel falando por si mesmo e não por uma enfadonha catalogação documental.

Hoje para acabar minha esbaldação de arte, fui à Pinacoteca do Estado , checar, já que era o último dia da mostra “Eliseu Visconti: Arte e Desig”, deste que foi nosso pintor que, como ninguém soube juntar a chamada Grande Arte com as Artes Decorativas do começo do século XX. A mostra era divina, exibindo os estudos preparatórios para a Boca de Cena do Teatro Municiapal do Rio de Janeiro a,ssim como seus cartazes, porcelanas, estudos de pinturas e volutas Arte Nouveau. Ele era nosso verdadeiro Klimt. Quem puder sugiro que quando forem ao RJ chequem com os próprio olhos a decoração do teto do Teatro Municipal assim como o pano de boca de cena. Viagei na mostra e sai de lá me sentindo numa Paris da Belle Époque!!

Muito bem para quem começou o final de semana escorregando por um tobogã à lá Playcenter num daqueles que já foi o local de grandes Bienais.

Deus do Céu. Ainda bem que Wilson e Visconti me salvaram!

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Queime depois de ler


O novo filme dos irmãos Coen, “Queime depois de ler”, em oposição ao sério, “Onde os Fracos não tem vez”,em que Javier Barden faz o papel de uma assassino frio e calculista numa espécie de faroeste dos dias de hoje ,é uma verdadeira ‘comédia de erros’. Todos os personagens são anti-personagens, anti- heróis. Tropeçam, caem, erram, dão tiros e matam por engano, não sabem chantagear. A trama, se é que assim pode-se chamar, trata do nada sobre o nada; ou seja, uma trama que se desenrola em cima da importância de um falso ‘conteúdo’. Na verdade é um filme inteligente que nos mostra toda uma rede de personagens imbelicilizados, um verdadeiro anti-filme.

Osbourne Cox (John Malkovich) é um analista que trabalha para a CIA. Ao chegar em uma reunião ultra-secreta ele descobre que foi demitido. Revoltado, ele resolve se dedicar à bebida e a escrever um livro de memórias. Katie (Tilda Swinton), sua esposa, fica espantada ao saber da demissão de Osbourne, mas logo deixa o assunto de lado por estar mais interessada em Harry Pfarrer (George Clooney), um investigador federal casado que é também seu amante. Paralelamente Linda Litzke (Frances McDormand), funcionária de uma rede de academias, faz planos para uma grande cirurgia plástica que deseja realizar. Ela tem em Chad Feldheimer (Brad Pitt), um professor da academia, seu melhor amigo. Até que um dia um CD perdido cai nas mãos de Linda e Chad, entregue por um faxineiro da academia. Ao perceberem que se trata de material confidencial, eles ligam para Osbourne Cox tentando conseguir dinheiro para evitar que seu conteúdo seja divulgado.

Brad Pitt esta hilário, um verdadeiro personal trainner idiota, que vive com uma garrafinha de água, mastigando chicletes e que não larga seus fones do iPOD, e parece nunca ter abandonado a mamadeira. MacDormand esta excelente no papel de uma mulher complexada em busca de ‘seu novo eu’, eternamente insatisfeita com seu corpo vive na internet à caça do homem perfeito. George Clooney é um amante idiota; um cafajeste que come toda e qualquer mulher que aparece na sua frente e jura falsas verdades de amor. Malkovitch talvez seja o personagem mais ‘sério’ do filme. Vive com os nervos à flor da pele.

O filme conta a história de pessoas incrivelmente cretinas que fazem coisas extremamente estúpidas relacionadas à sexo e a vida em si. O que torna tudo mais interessante é que não se tratam de políticos, mas de pessoas normais, como todas nós....

Não consegui me segurar de tanto rir. O filme fala de anti -espiões, é uma verdadeira homenagem aos filmes de espionagem, onde pululam chantagens,heróis gostosões e tramas diabólicas e pitorescas.

Uma verdadeira comedia de humor negro.

Nos faz pensar a respeito das estupidez humana e perceber de verdade que estes seres banais e idiotizados estão muito presentes em nossas vidinhas cotidianas.....