quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

O Discurso do Rei ( e o nosso)


O Rei da Inglaterra era gago. Vi por estes dias o excelente filme "The kings speech'. O filme é primoroso, com o excelente Geoffrey Rush, que já viveu o falante Marques de Sade , fazendo aqui um psicoterapeuta da voz, e o também excelente Colin Firth faz o retraído e gago rei George V. Impressionanete como o filme que se insere na Inglaterra dos anos 30/ 40 é tão contemporâneo.Trata de coisas grandiosas e assuntos tão pulsantes no mundo atual. Vivemos uma época em que falamos sem sermos ouvidos, nossos discursos são omitidos de nossas faces, somos quase sempre criaturas sem rosto, sem voz, de escritas, vide a quantidade das redes sociais que se multimplicam.Criamos avatares, somos personagens de nós mesmos mas não damos a cara à tapa.
O filme também mostra o surgimento e expansão do fenômeno radialistico, visto na época como tecnologia mor, onde ainda não existia a imagem que fala (TV).
O rádio possibilitou a saída da voz privada para a pública; o evento da divulgação de discursos sejam estes em sua maioria demagógicos e empedernidos de poder, ou da rádio-novela.. A voz era algo que nos autorizava poder, ação, mobilidade . Hoje ouço sussuros em meio a "véios", "partiu's", "entendeu", "tipo assim" e otras cositas más estranhas. Não tomem meu texto com uma purista que voz escreve, também uso gírias e adoro elas. Assim como palavrões. Mas todos eles são alguns dentre outros recursos da nossa expressão linguística e não formam apenas eles, um vocabulario coeso. Cada vez mais creio que a leitura e o contato fisico com livros, jornais, fanzines deve aumentar. A relação com estes deve ser estimulada. Me dói ouvir como já ouvi diversas vezes: "não consigo ker um livro, me dá sono, preguiça;não tenho paciência". Do contrário daqui a pouco só vamos nos relacionar no nível virtual e "touchable" das telas sensorializadas; trasaremos com máquinas e conversaremos (ou faremos monólogos) com robôs, e isso apenas!
Em determinado momento do filme o rei fala " I have a voice, i am the king " aludindo ao seu desejo de se fazer ouvido, escutado. Cada vez mais vivemos a individualidade da escuta de nosos sentimentos e desejos, as pessoas se usam como produtos e as relações são cada vez mais superficiais. Nao somos mais os reis de nossas vozes, creio que vivemos numa falsa democracia, onde não nos escutam e não exigimos por aquilo que tributamos. O rei do filme consulta-se com um pscicólogo da voz, senta-se num sófa que tem ao fundo uma parede descascada ao inves de algum papel de parede decô estilizado. Metaforas que fazem uma crítica ao desfalecimento de uma monarquia nos dias atuais,á pessoas que servem como mariontes nas maos de outros poderes. Vivemos um momento em que o desfalecimento de ditaduras de décadas no poder parecem crescente (tomara!). Será que a monarquia inglesa ainda faz algum sentido, mesmo que apenas o da sucessão dinástica? Vozes mudas, ueninguem ouve, vozes que praguejam, xingam (hilário o momento que o rei deixa sair de sua garganta xingamentos ), vozes de um poder besta que não presta-se a nada (como metaforiamcanete o psciologo fala em determinado momento). A historia é veridica, e percebemos que o que nos cura é aquilo que nos acalenta, conforta, protege mas ao mesmo tempo nos possibilita autonomia e segurança no estar e ser. Freud já dizia: " o que não é dito torna-se sintoma". O rei precisa falar e se saber entendido para existir enquanto tal. A alteridade pela fala.
Como professora percebo cada vez mais pessoas que não tem dominio de um vocabulário próprio , que pouco lêem, que se expressam cada vez mais por girias. Palavras vazias de conteudos e de expressividade. Vazios de quenturas e presenças, vazios de discursos. Me preocupa muito a fase tecnologica e virtual em que nos inserismos. onde a expressividade basica do ser humano, que é o falar e se expressar foi renegada aos valores virtuais. Por onde andam as vozes das pessoas nos dias de hoje? Somos gagos sociais, encolhemos frases, restringimos significados, nao temos mais a fluência da fala, não sabemos escrever corretamente pois temos preguiça de nos deleitar nas folhas de livros. Somos consumidores de imagens e de produtos , mas de conteudos vagos e vazios. Quando vejo uma pessoa que sabe falar e se comunicar o espanto é tamanho como se isso fosse algo anormal nos dias de hoje
Creio que nossa gaguice é endêmica.