quarta-feira, 14 de maio de 2008

Quero a dor e a delícia



Não quero a felicidade que esta nas coisas.
Chaplin foi sábio em seus “Tempos Modernos”, assim como Jacques Tati em seu “Mon Oncle “ e “Playtime”.
As máquinas não nos salvam, nos tornam escravos, ciborgues contemporâneos na busca incessante do melhor , do maior, do mais potente e do mais moderno. Não quero “ O MAIS” ! Não quero o Carro com 6 Air Bags, não quero o câmbio Bio Zetrônic sei-lá-oque; o celular que tem câmera de 15 mil pixels, 168 funções, toca música sem parar. Você liga a televisão e a felicidade esta na aquisição de celulares, carros e televisores ( que mais parecem achatados por rolos compresssores). As coisas bastam a si mesmas; o superar-se em funções mega-múltiplas e híper. A internet que navega a milhões de k-bites por minuto; a geladeira que parece uma nave espacial, o assento do carro que esquenta a bunda. As câmeras nos vigiam e supervisionam.Vivemos o "Alphavile" godardiano. As pessoas querem ser famosas e ricas. A ambição e o poder são a lei desta selva. O aparelho de ginástica que perde a barriga por você, o câmbio que muda a marcha por você, o celular que substitui o olho no olho e o beijo na boca. O I Phone que lhe informa tudo, porque você TEM E DEVE estar antenado e sabendo o TUDO AO MESMO TEMPO AGORA.
Quero alienar-me, sentir o sol escaldante em minha face.Quero o gozo, a gargalhada, a tristeza, o choro, o ódio, o tapa na cara. Quero ser eu mesma,poder me dar ao luxo de me entregar às minhas inquietudes e expressá-las, transbordar-me. Quero pessoas feitas de carne e osso e não caras botoquizadas ,uniformizadas.
Até os protetores solares te impedem de se dourar; porque parece que agora, o sol, tornou-se nosso inimigo. O Refrigerante é ZERO calorias. Tudo encontra-se na capacidade e potência das coisas.O imperialismo do viver igual, consumir igual e deixar-me manipular eu vomito!
Os gadjets modernos nos oferecem funções que não temos tempo de sorver. São melhores que nós, que nossa 'falitude'. O Frankstein moderno não me seduz. O sexo já ficou plástico, os peitos siliconados, as pessoas frágeis demais.
Umberto Eco disse numa entrevista outro dia: " prefiro ser uma pessoa inquieta ao invés de feliz ", portanto deixem-me sentir incompleta, com partes faltantes e ir atrás deste conteúdo nas noites debruçadas sobre livros, nos cinemas, nas conversar de bar com os amigos, na VIDA ela mesma.
Fiquem com suas máquinas, com o egoísmo auto-alienante. Fiquem com as masturbações eletrônicas e me dêem pessoas, paisagens, bichos, toques e relações.
Me parece que a fantástica cena em que Barbarella no filme de mesmo nome, faz 'sexo' com um homem pelo simples encostar de mãos após engolir uma pílula mágica, não encontra-se tão longe de nosso presente. Não quero pessoas movidas por engrenages e sim por sangue e hormônios descontrolados bombando nas veias.Não quero ser jovem para sempre, quero poder envelhecer, enrugar-me, sofrer a ação da lei da gravidade. E cada vez mais por aí, eu vejo pessoas MENOS. Elas estão mais fracas, mais medrosas, mais covardes. Mais deprimidas. Pois até sofrer, chorar, não podemos mais, somos obrigados a nos comportar como seres letárgicos e hipnotizados pelos efeitos sedativos da vida e das dores e delicias desta, pelas chamadas pílulas da felicidade.
Quero o a superpotência do nada, o VAZIO, o silêncio.

Pode chover agora.

2 comentários:

Anônimo disse...

Lindo texto. Esse mesmo vazio que vc retrata ja foi explorado por uns caras como Antonioni, Tarkowski, Gogol... Ele pode ser riquíssimo para arte e porque não para a vida? Fico feliz de vir aqui e ver um estilo nascendo e com uma verve ácida e inteligentíssima. Segue fazendo a pena correr pelos papéis aí, Dan...

Beijones!

Priscilla Vassão disse...

Quero sangue, quero pele, o tapa na cara e conversas intermináveis. Quero coisas impalpáveis e sonhos pagãos. Não quero objetos e sonhos de outras pessoas.
Dani, você é tão parecida comigo!